Escolhemos essa data mística para trazer para vocês entrevista feita pelos colunistas João Jorge e Maicon Tavares com a herdeira de Chico Preto, um dos maiores ícones das religiões de Matriz Africanas
Montes Claros sempre foi marcada pelas crendices populares, principalmente pelo espiritismo. Nas décadas de 60 e 70, vários Umbandistas marcaram a cidade norte mineira. Quem não se lembra de nomes como: Terezino Nery de Santana, Zé Fernandes, Mãe Alcina, Dona Geralda, Castelo, Dona Maria de Gregório, Messias Preto, Messias Catingueiro, Dona Ana, Dona Rosa e Nelson Pinto, Chico Preto e tantos outros.
Um destes nomes virou lenda e comentário em todas as rodas, transcendeu barreiras e transformou-se em noticiário nacional através do Programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, ou nas páginas das extintas revistas Manchete e O cruzeiro. Trata-se do velho Chico Preto, que, segundo crendices da Umbanda, morria toda sexta-feira, era enterrado no Cemitério do Bonfim e ressuscitava na madrugada, reaparecendo em casa, como se nada tivesse acontecido. Você acredita nessas histórias? Duvida ou concorda que Chico Preto tinha mesmo pacto com o Diabo?
Nesta reportagem de João Jorge e Maicon Tavares, neste mês agosto, visto por muitos como mês do desgosto e do cachorro louco, para muitos uma época fatalista e cheia de superstições devido ao tempo quaresmal da quimbanda e magia negra, desvendamos o misterioso mundo de Rosa Ferreira dos Santos, mais conhecida como Rosa Capeta ou Rosa Diabo, ícone da Umbanda e da Quimbanda, que herdou os dons espirituais de Chico Preto, o mais temido Umbandista de todos os tempos.
Em entrevista, ela revela, entre outras coisas, se Chico Preto tinha ou não um pacto com o Diabo. Aqui, ela também declara que ele não matou a filha de Glória Perez, autora de novelas da Globo, em ritual macabro, como noticiaram na época.
Rosa, quanto tempo você trabalhou ao lado de Chico Preto? Rosa Diabo: Desde os 13 anos de idade. Eu sou natural de Manga, comecei olhando os filhos dele, depois passei a trabalhar com ele no terreiro. Ao todo foram 41 anos de convivência. Este terreiro existe desde a década de 50.
Dizem que Chico Preto morria toda sexta-feira, sendo enterrado no Cemitério do Bonfim, ressuscitando, depois, na madrugada. É verdade? Ou é lenda? Rosa Diabo: Ele fazia uma obrigação às sextas-feiras no Cemitério do Bonfim, um trabalho espiritual. Isto acabou virando folclore, cultura popular e despertou a curiosidade de muita gente.
É verdade que Chico Preto tinha o pacto com o Diabo? Rosa Diabo: Bom, isso ele nunca me revelou, se tinha esse pacto. Nem para mim nem para ninguém. Era o segredo profissional dele.
E você, Rosa, tem um pacto com o Diabo? Rosa Diabo: Não! Não fiz pacto com ninguém.
E porque, então, ganhou o nome de Rosa Capeta? Rosa Diabo: Porque a tradição virou mito. Eu incorporava Exú e aí me colocaram esse apelido. Eu tenho vários apelidos: Rosa Capeta, Rosa Diabo, Rosa de Satanás, Rosa Vodu ou Rosa de Chico Preto.
É verdade que a figura diabólica de Chico Preto surgiu quando assassinaram seu filho de criação? Rosa Diabo: Seu poder surgiu aí. Na época, um policial chamado Elias, que eu não conheci, pois não morava aqui, foi até o bar de Chico Preto, que, na época, tinha um comércio. Ele queria matar Chico, mas como não o encontrou no bar, atirou em Joaquim, que era seu filho de criação. Alguns minutos depois, o assassino morreu, caindo numa valeta do bicano. Por incrível que pareça, ele acabou morrendo primeiro que o filho de Chico, que tentava socorro em um hospital.
Em 1993, em reportagem do Fantástico, e das revistas Amiga e Manchete, na época, surgiu o boato de que a filha de Glória Perez teria sido assassinada em um ritual macabro orientado por Chico Preto, o que há de verdade nisto Rosa Diabo: É mentira. Realmente a tevê noticiou esse fato, mas acabou desmentindo imediatamente. Isso não aconteceu de forma alguma, ele sempre foi amigo dos artistas, muitos deles vinham do Rio de Janeiro para se consultar com ele, inclusive Chico Anísio. Quem matou, de fato, Daniela Perez foi o Guilherme de Pádua, que contracenava com ela na novela de sua mãe. Foi ele e sua esposa Paula Ferraz. Ele ficou sete anos preso, pena muito curta pela barbaridade que cometeu e hoje, por incrível que pareça, é pastor evangélico da Igreja Batista Lagoinha, em Belo Horizonte. Portanto, ela foi assassinada barbaramente por um homem que hoje é um pastor evangélico.
Como era Chico Preto como pessoa? Rosa Diabo: Ele era uma alma nobre. Várias pessoas chegavam aqui endividadas, ele mandava pagar o aluguel, dava comida, tratava bem a todos.
Quais políticos de expressão procuravam Chico Preto: Rosa Diabo: Ele chegou a receber vários ex-prefeitos da cidade de Montes Claros e região. Recebeu, também, para consultas, os ex-presidentes JK e Tancredo Neves (na época Tancredo era governador de Minas). O ex-governador de Minas, Aureliano Chaves, sempre que vinha a Montes Claros, gostava de se consultar com ele.
Você é de fato a herdeira espiritual de Chico Preto? Rosa Diabo: Sim, a única. Muitos se dizem herdeiros espirituais dele, mas quem, realmente, possui essa força sou eu.
Na rua, você nunca enfrentou manifestações contrárias da população? Rosa Diabo: Muitos quando me veem fazem nome do pai. Vários desconjuram, dizem que sou a figura do Diabo. Quando passo na rua, alguns viram a cara. Há pessoas que quando entro em algum lugar, saem. Se eu estiver de costas, viram de frente. Alguns evangélicos ungem minhas portas com óleo, meus portões já estão, inclusive, enferrujados. Eles dizem que é para afastar o Satanás.
Rosa, existe amarração de amor? Rosa Diabo: Existe, com certeza. Olha, eu faço cada uma…
Quem mais procura, heterossexuais ou gays? Rosa Diabo: Faço amarração de homem com homem. Mulher com mulher. Homem e mulher. E por aí vai. Hoje até que não tá precisando muito porque os gays estão no auge e os homens estão correndo atrás deles (Risos).
O Brasil tem jeito? Rosa Diabo: O Brasil não tem futuro. Pobres e ricos estão roubando.
Você é a sucessora de Chico Preto. E quem será o sucessor ou sucessora de Rosa Diabo? Rosa Diabo: Eu já escolhi. Será um de meus primeiros filhos de Santo, o Flávio Gomes, mais conhecido como Pássaro Preto. Nele eu confio, pois entende do assunto, é sério, comprometido com a Umbanda e tem espírito de verdade. Eu hoje estou passando o comando para ele. O que ele falar, tá falado. Quero agora é muito amor e curtir a vida, mas, claro, jamais abandonarei o terreiro Estrela do Oriente.