“Se você não vender, vou fazer da sua vida um inferno”. Essa frase absurda, acredite, é mais comum do que se parece, não em qualquer trabalho, mas em uma empresa de Call Center com duas sedes em Montes Claros, conforme funcionários e ex-funcionários.
O ramo de serviços, o setor de telemarketing é o que mais cresce no Brasil. As ofertas de postos de trabalho não só aumentam, mas a dificuldade de encontrar quem topa trabalhar nesse tipo de função, também é grande, devido ao nível de cobranças. Segundo levantamento do Ministério da Economia, o setor de call center está entre os maiores empregadores do Brasil. O motivo, é que esses postos de trabalho são vistos por muitos jovens como a porta de entrada para o mercado profissional. O setor além de ser um dos maiores empregadores também apresenta altas taxas de rotatividade, uma situação que impacta a saúde financeira e, principalmente, a qualidade do atendimento prestado pelas empresas.
Não é de hoje que as empresas de Call Centers são alvos de denúncias. Funcionários e ex-funcionários relatam uma série de abusos praticados dentro das empresas. Operadores denunciam assédio moral, exploração, humilhações por não cumprir metas e obrigatoriedade de fazer hora extra, dentre outras reclamações.
Um perfil no instagram em Montes Claros tem se tornado fonte das denúncias. O @vgxdadepressao. A página com pouco mais de 1500 seguidores virou uma espécie de portal do desabafo, local onde se encontra de tudo, denúncias, humor e até pessoas que querem encontrar um amor no local de trabalho.
Tudo é divulgado com a maior descrição, principalmente quando o assunto são as denúncias. A pessoa que se sente lesada tem a liberdade de abrir o coração e colocar tudo que passou ou tem passado na empresa pra fora. A partir daí, é só esperar colegas e ex-colegas relatando ter vivido o mesmo ou algo parecido. As denúncias são tantas que o perfil até criou, recentemente, parceria com escritórios de advocacia para ajudar essas pessoas.
Essa internauta reclama: “Eu gostaria de saber quando foi que hora extra deixou de ser algo opcional e passou a ser obrigação? Porque a forma em que os supervisores vêm cobrando isso não só faz parecer que é obrigação do funcionário, quando também fica parecendo que a gente ganha por fazer hora extra. E quando sabemos que a empresa nunca paga, nem nunca pagou. Tá chegando ao ponto de supervisor na equipe ameaçar com advertências aqueles que não têm disponibilidade pra fazer H.E e até mesmo querer que o operador cancele seu compromisso marcado fora do horário de trabalho pra poder logar mais cedo. Ameaças sempre seguida de ‘senão fizer hora extra amanhã, me paga semana que vem’, ‘vou fazer da vida do operador que não quer trabalhar um inferno’, ‘tô nem aí se vou ter ouvidoria, não vai ser a primeira, nem a última’, etc”, relatou uma seguidora.
Uma funcionária que prefere não se identificar conta que esses abusos ocorrem desde que a empresa levantou sede na cidade, em Montes Claros no ano de 2013.
“A empresa vai te trazer metas irreais, que não existem. São absurdas e abusivas e não aceitam se você não consegue vender”.
Essa ex-funcionária conta que teve um problema grave de saúde e mesmo com a doença, uma trombose pulmonar, ainda preferiu se esforçar e ir para o trabalho. Mesmo ouvindo muitas pessoas relatarem insatisfação no tratamento que é dado aos funcionários, ela ainda acreditava que pudesse ser feliz e fazer a diferença. O entusiasmo da operadora, logo virou decepção. Ao completar três meses, foi demitida sem direito a saber o porquê e com vários problemas de saúde.
“Queria que informassem como a VGX é podre e sem um pingo de humanidade. Fui demitida nos 90 dias, porque peguei atestado. Não atestado porque eu quis. Descobri que tenho trombose no pulmão e eu nem queria ficar de repouso, mas eu tive que ficar. Nunca fui uma péssima funcionária. Estava sempre no primeiro quartil. Batia meta. Pegava folgas aos sábados como benefício. Folgas que eu preferia nem ter. Preferia ir trabalhar, no qual já deixei isso claro várias vezes. E olha que já passei por várias humilhações. Eu entrei saudável, forte e sai com ansiedade atacada. Com infecção urinária, porque a suposta supervisora, quem nem é por sinal, reclama de levantar para urinar. Eu até passei a evitar levar água. Eu deixei de ir embora para tratar minha doença causada por puro estresse, meu pai, medico, minha mãe, enfermeira e psicóloga sabia que não era brincadeira e me mandaram voltar para minha cidade para cuidarem de mim e eu deixei de ir porque eu tinha um compromisso com a empresa. Doente, passando mal, me demitiram sem justificativa… Me trataram como se eu fosse um lixo”.
Segundo as denúncias, xingamentos já viraram rotina.
“Oi somente um desabafo aqui! Acho que os feedbacks dos supervisores deveriam ser gravados e monitorados. Eles não podem desrespeitar os operadores porque respeito cabe em qualquer lugar. Eles têm que perder a preguiça e monitorar as ligações. Saber em qual momento a pessoa está perdendo o cliente, se a ligação caiu e porque não conseguiu vender. Não adianta falar que suas vendas caíram sem saber quantas ligações você atendeu. Eles não respeitam os operadores sendo que eles também são funcionários, não consigo entender essa postura. Usam vocabulários baixos como lixo, otária, “porra”, não possuem ética profissional nenhuma para trabalhar”, desabafa”.
As reclamações são diversas, inclusive por parte do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações do Estado de Minas Gerais (SINTTEL). O sindicato reclama da falta de comprometimento da empresa com relação ao processo 0011342.88.2019.5.03.0145 de ação coletiva aberto pelo sindicato. O processo é sobre o ressarcimento dos tickets obrigatórios que a empresa deixou de pagar entre os anos 2015, 2016 e 2017. A empresa tinha até setembro para ter repassado a lista de trabalhadores beneficiários, mas não responde as demandas do sindicato. O prazo venceu, foi solicitado na novamente diante da justiça a obrigatoriedade da empresa cumprir com suas responsabilidades, mas foram ignorados.
O Sindicato divulgou uma nota na última segunda-feira (18/10).
Nota na íntegra:
Demonstrando sua total falta de respeito com seus próprios trabalhadores, a VGX não cumpriu sua palavra, e, simplesmente, ignorou os compromissos firmados pela própria empresa durante a reunião de mediação realizada no dia 14/09/2021, na Superintendência Regional do Trabalho/Ministério do Trabalho. Desta vez, em nova rodada de mediação (15/10/2021), a VGX não deu as caras e passou a mensagem de que pouco se importa com seus empregados, e com os abusos cometidos em suas instalações, bem como a violação de vários direitos dos trabalhadores.
Veja os compromissos ignorados pela VGX:
- Enviar até o dia 04/10/2021, para o SINTTEL-MG, respostas para todas as questões colocadas na mediação do dia 14/09/2021 – A VGX não enviou!
- Reunião entre SINTTEL-MG e empresa agendada para o dia 08/10/2021 – A VGX ignorou!
- E, por último, a mediação marcada para o dia 15/10/2021 no Ministério do Trabalho – A VGX também não participou!
O SINTTEL-MG não vai deixar barato! O Sindicato tomará todas as medidas legais contra a VGX, com o objetivo de garantir que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados. Não vamos admitir que uma empresa, em tão pouco tempo de operação em Montes Claros, cometa diversos abusos contra seus empregados e saia impune.
Devido à ausência da VGX na mediação realizada dia 15/10/2021, assim como o não cumprimento dos compromissos combinados anteriormente, o Sindicato solicitou ao Ministério do Trabalho que seja feita fiscalização na empresa para apurar a “chuva” de denúncias feitas pelos trabalhadores. Além disso, o SINTTEL-MG encaminhará para que o Ministério Público do Trabalho investigue as denúncias de Assédio Moral.
Ressaltamos a participação fundamental dos trabalhadores que denunciaram todas as irregularidades cometidas pela VGX, tornando possível que o SINTTEL-MG tomasse as medidas legais contra a empresa. Por isso, é essencial que os trabalhadores continuem denunciando as irregularidades cometidas pela empresa.
Denúncias
- aglomeração para acesso às dependências da empresa;
- descumprimento do decreto municipal que prevê a colocação de 50% do quadro em Home Office;
- não concessão de pausa descanso;
- limite de dez minutos para pausa banheiro, ensejando, quando excedido, exigência de horas extras (“para pagar hora”);
- campanha de folgas fictícias tendo em vista sua associação a banco de horas positivo, volume de vendas e qualidade, embora os trabalhadores não tenham acesso a controle de jornada, nem ao monitoramento da sua produtividade;
- descumprimento da cláusula 12ª da CCT quanto à previsão de que cabe ao trabalhador optar pelo vale refeição ou pelo vale alimentação, agravado pelo fato de que os empregados enfrentam dificuldades no uso do vale refeição fornecido já que a bandeira tem aceitação restrita;
- na ocorrência de problemas sistêmicos, os trabalhadores são obrigados a pagar horas;
- exigência de observância de script também em descumprimento da NR 17;
- uso de equipamento pessoal, sem contrapartida financeira, no caso de Home Office;
- implementação da pausa descanso pela empresa, a partir da abertura do processo de mediação, tendo, contudo, aumentado a jornada em vinte minutos, embora sem aumentar proporcionalmente o salário e adotado tal medida embora o contrato de trabalho estabeleça jornada de 6 horas;
- tratamento dispensado pela coordenação com traços de humilhação;
- exigência de devolução de crédito remanescente de vale transporte por meio de PIX para CPF de pessoa física indicada pela própria chefia, gerando, ademais, suspeita e desconfiança quanto à possibilidade de desconto em duplicidade.
O Portal Gerais News entrou em contato com a VGX, mas não obteve retorno.