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Entre a abundância e o abandono: o Norte de Minas diante de um futuro ameaçado

Entre a abundância e o abandono: o Norte de Minas diante de um futuro ameaçado

O agronegócio mineiro vive um momento emblemático. Seu Produto Interno Bruto (PIB) já ultrapassa o da mineração, setor historicamente dominante na economia do estado. No entanto, essa virada estratégica não tem se traduzido em apoio governamental proporcional à sua importância. O campo segue crescendo — e resistindo —, mesmo sob o peso de burocracias, sanções desproporcionais e um cenário de insegurança jurídica.

No Norte de Minas, esse contraste ganha contornos ainda mais evidentes. A região concentra algumas das maiores oportunidades para o desenvolvimento sustentável do agronegócio no Brasil. Com clima propício, disponibilidade de terras planas, mecanizáveis e irrigáveis, além da presença estratégica do Rio São Francisco, a área se mostra ideal para a produção de frutas e grãos em larga escala. Mais que produtiva, a agricultura irrigada praticada ali é considerada uma das formas mais sustentáveis de cultivo, pois evita a expansão sobre áreas frágeis, aumenta a eficiência por hectare e impulsiona a economia local.

Mesmo assim, produtores formais enfrentam um paradoxo: quanto mais tecnificados e ambientalmente corretos, maiores as exigências e obstáculos. As normas ambientais, muitas vezes desconectadas da realidade do semiárido, impõem penalidades rígidas, enquanto violações graves cometidas em nome de “ocupações tradicionais” passam despercebidas. Áreas de Preservação Permanente (APPs), como as margens do próprio Rio São Francisco, estão sendo invadidas e degradadas sem qualquer reação concreta do poder público. O resultado é a perda acelerada da mata ciliar, aumento do assoreamento e a ameaça crescente ao principal recurso hídrico da região.

“O rio está sendo sufocado. Enquanto o agricultor que segue a lei é punido, quem desmata e ocupa ilegalmente avança impune”, afirma um produtor local que preferiu não se identificar. O relato é mais um entre muitos que apontam para uma omissão crônica do Estado e da União na gestão e fiscalização ambiental, comprometendo não apenas o equilíbrio ecológico, mas o futuro da produção agrícola irrigada na região.

A escolha, agora, é histórica. O Norte de Minas está diante de duas possibilidades: se tornar um polo nacional de produção sustentável, com base na agricultura irrigada tecnificada, ou mergulhar ainda mais no ciclo da pobreza e da degradação ambiental. O que falta, segundo especialistas e produtores, não são recursos nem tecnologia, mas vontade política e coragem institucional para enfrentar os desafios com seriedade.

“Não precisamos de tutela. Precisamos de regras claras, segurança jurídica e infraestrutura. Com isso, o agro caminha sozinho — e leva junto desenvolvimento, emprego e preservação”, reforça um técnico agrícola que acompanha projetos na região.

O Rio São Francisco, símbolo de vida para o semiárido mineiro, ainda pode ser a base de uma nova era de prosperidade. Mas, se o cenário atual persistir, seu legado poderá se reduzir a uma memória de potencial desperdiçado.

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